Hoje em dia assume-se
que a etiologia da síndrome do conflito sub-acromial no ombro é multifatorial.
Os fatores mecânicos que potencialmente contribuem para esta patologia são:
- Alterações no controlo neuromuscular
- Diminuição da força da coifa dos rotadores e músculos peri-escapulares
- A morfologia e postura do acrómio
- Rigidez da cápsula articular posterior
Entre estas disfunções,
os autores deste estudo de caso concentraram-se na análise da retração da
cápsula posterior, que pode ser confirmada clinicamente por uma limitação na
adução horizontal e na rotação interna do ombro.
De um ponto de vista
clínico vários autores demonstraram que existe uma estreita correlação entre a
perda de adução horizontal e a limitação da rotação interna. A relação entre
estas duas é que as limitações de 1cm da adução horizontal correspondem a uma
redução de 4º de rotação interna.
Num estudo sobre
artrocinemática glenoumeral, verificou-se que a redução cirúrgica da cápsula
posterior causou uma translação “anormal” em sentido antero-superior durante a
flexão do braço. Recentemente, começou-se a suspeitar que este mecanismo de
translação “anormal” também é um dos fatores indutores não só para o conflito
sub-acromial, mas também para as lesões no labrum glenóideo superior em atletas
de voleibol, ténis, natação, etc.
Este estudo de caso clínico
nasceu da dúvida dos autores sobre se a limitação na rotação interna do ombro
poderia ser apenas causada por uma retração da parte posterior da cápsula, ou
esta limitação poder ter um componente muscular, mais ou menos significativo, nomeadamente
contracturas nos músculos infra-espinhoso e redondo menor.
Apresentação de caso clínico
- Homem, de 42 anos, trabalhador braçal, veio a consulta com queixas de dor no ombro direito, que se mantinham há já 12 semanas. O início dos sintomas foi insidioso.
- A dor era intermitente e causada/agravada por mover o braço além dos 90º de elevação ou por dormir sobre o lado direito. A intensidade da dor nunca foi tão forte a ponto de interferir com as atividades de trabalho e quando sentiu ser necessário o paciente usou AINEs e compressas de gelo para aliviar a dor.
- Todo o ombro estava doloroso (particularmente na área do deltóide), mas sem dor irradiada. O paciente não sofria de nenhuma dor em redor da área cervical ou no membro superior.
- Não houve outras descobertas significativas durante qualquer parte da história.
- O exame não mostrou diferenças no trofismo muscular ou assimetrias posturais significativas. O ritmo escápulo-humeral estava equilibrado, apesar de, no final do movimento haver uma ligeira restrição da elevação à direita, com dor que aparecia no fim do movimento.
- A avaliação da amplitude de movimento passivo só demonstrou uma limitação da rotação interna do ombro direito em relação ao ombro esquerdo. Testes musculares manuais não revelaram fraquezas, embora a abdução resistida tenha provocado dor.
- Os testes de impingement foram positivos, particularmente o teste de Hawkins, o teste de Yocum e o teste de compressão ativa de O'Brien.
O diagnóstico de
síndrome do conflito subacromial foi confirmado pela sintomatologia do paciente
correspondente aos critérios de inclusão/exclusão identificados por diversos
autores.
Antes de tratar o
paciente, a amplitude de rotação interna foi medida. As medições foram
realizadas com um inclinómetro. A força aplicada pelo fisioterapeuta para rodar
o braço foi medida com um dinamómetro electrónico ligado ao pulso do paciente.
A força utilizada para as medidas pré e pós-tratamento foi idêntica. Foram feitos
testes musculares resistidos em abdução, rotação interna e externa, conforme
descrito por Cyriax. A força resultante foi medida com um dinamómetro, de modo
a usar os mesmos valores para o ensaio de controlo. Por último, foram
realizados testes de contusão (Yocum de e Hawkin) e o teste de compressão
ativa (O'Brien). Mesmo para estes testes, as forças resultantes foram medidas
com um dinamómetro para que pudessem ser reproduzidas exatamente durante os seguintes
testes de controlo.
A dor provocada por estes testes foi medida utilizando uma
escala visual analógica (EVA), imediatamente após a conclusão dos testes.
Tratamento
A fim de tratar apenas
a parte muscular do ombro, sem afectar a cápsula, o paciente foi colocado de
bruços, com o braço seguro a seu lado, numa posição relaxada.
O paciente recebeu uma
massagem de 7min no infra-espinhoso e de 3min no redondo menor. Os autores
consideram que este tempo de massagem era suficiente para produzir uma
alteração no músculo. A massagem foi feita apenas sobre as áreas do
infraespinhoso que estavam contraturadas e dolorosas à palpação e sobre a
totalidade do redondo menor (devido ao seu tamanho pequeno), movendo-se as
pontas dos polegares de uma forma circular. A força aplicada estava relacionada
com a capacidade do paciente para suportar a dor.
Todas as medições
anteriores foram feitas outra vez no fim de cada tratamento.
O tratamento consistiu em
três sessões, dadas em dias alternados. Durante o tratamento o paciente não
tomou a medicação ou mudou a sua rotina diária. Além disso, ele não recebeu
qualquer outro tratamento ou praticou qualquer exercício em casa.
Conclusão
Após três sessões de
tratamento, a amplitude de movimento articular em rotação interna aumentou em
20º.
Na EVA observou-se uma
clara melhoria em todos os testes administrados. Na abdução resistida
verificou-se uma diminuição do valor inicial de 2,8 para 0, e no teste de Hawkins foi de 3 para 0,3. No teste de Yocum foi de 3 para 0,1 e no de compressão activa de O’brien foi de 2,3 para 0.
Os resultados obtidos no
tratamento deste caso clínico mostram como uma restrição na rotação interna do
ombro pode ser causada por uma contratura dos músculos posteriores e não exclusivamente
por uma rigidez da cápsula posterior.
Este estudo de caso
clínico sugere que a massagem dos músculos infraespinhoso e redondo menor pode
tornar possível ganhar 20º de rotação interna em pacientes com síndrome do conflito subacromial.
No entanto é, obviamente,
necessário fazer estudos sobre um grande número de casos, para confirmar esta
hipótese e calcular a incidência do componente muscular versus o componente
capsular nestes casos clínicos.
Poser A, Casonato O. Posterior glenohumeral stiffness: capsular or muscular problem? A case report. Man Ther. 2008 May;13(2):165-70.
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